Para quem vem de fora, esta expressão pode até soar estranha. Não para os paraenses. Não é exagero falar que o açaí compara-se ao pão ou ao feijão com arroz como alimento diário de milhares de habitantes no Pará e em outros estados da Amazônia, como o Amapá.
O Pará é o maior produtor do fruto no Brasil, responsável por cerca de 85% da produção nacional. Os outros 15% são distribuídos por Amapá, Amazonas, Rondônia, Acre e Tocantins.
Hoje em dia o açaí está presente não somente na mesa dos paraenses, como refeição principal acompanhado de peixe, camarão seco ou charque frito, além da farinha ou como sobremesa (com ou sem açúcar), mas em vários lugares do Brasil. Seja nas academias paulistanas, nas casas de suco do Rio, nas sorveterias de Fortaleza. Presente também na Europa, Estados Unidos e Japão.
No entanto, muitos não fazem ideia de como o fruto chega até suas mesas e tigelas. A colheita é feita de forma artesanal. O fruto deve estar na coloração roxo-escura ou verde-escura (conforme a variedade), coberta por uma camada acinzentada. O coletor deve subir na palmeira, geralmente com altura de 10 a 15 metros, usando um instrumento chamado “peconha”, chegando até onde fica localizado o cacho do açaí e fazendo um corte em sua base. O fruto deve ser selecionado já no local para separar as partes indesejáveis à comercialização. Há o trabalho de separar os pequenos frutos das hastes dos cachos (trabalho este chamado de “debulhamento’). Neste processo verifica-se quais frutos estão aptos para consumo. Aqueles que foram atacados por inseto ou que tenha fezes de aves são prontamente descartados. Evita-se o contato direto com o solo para que não contamine o produto. É um trabalho oneroso que muitos de nós não temos o conhecimento.
Depois de todo esse processo, ainda temos a parte da higienização, do acondicionamento, do armazenamento e do transporte até os grandes centros de comercialização.
O açaí comercializado em Belém vem geralmente das ilhas do entorno da cidade ou de municípios como Abaetetuba, Igarapé-Miri ou da Ilha de Marajó. Detalhe: O Marajó é o único local onde há açaí durante o ano todo. Por aqui a produção cai nos períodos de chuva (de novembro a março); no verão amazônico (de abril a outubro) acontece o inverso.
O horário é muito importante para o transporte. Geralmente é comercializado durante a madrugada. Neste caso, devido ao fato de a temperatura estar mais amena, o processo de degradação do açaí é menor. Em Belém, antes do raiar do dia, podemos observar o movimento dos barcos (o meio de transporte mais utilizado e também o mais prático, devido os açaizais estarem localizados em áreas de várzea), trazendo o fruto até à Feira do Açaí, no complexo do Ver-o-peso. Açaí para todos os gostos, do roxo ao branco, vendidos em cestos (ou rasas) confeccionadas com fibras de jacitara ou de guarumã, prontos para abastecer dos supermercados dos bairros nobres ao mais simples ponto de venda nos bairros periféricos da cidade.
O lado bom dessa história é o fato de o fruto ser reconhecido Brasil afora, como parte dos costumes da Amazônia e, especial, de Belém. Dos restaurantes às barracas de comida no Ver-o-Peso, o açaí está lá. Mas todo esse reconhecimento tem seu preço. Nos últimos anos as exportações aumentaram bastante. Isso faz com que o açaí que fica aqui fique extremamente caro, chegando ao absurdo de se cobrarem R$ 24,00 o litro. Para quem, dez anos atrás, comprava a R$ 3,00 o litro, fica insustentável consumi-lo todos os dias. Ruim para todos, especialmente para as famílias mais pobres que, mais uma vez, são excluídas a ponto de não poderem consumir algo que é tão nosso. Hora de repensar e não deixar que o mercado exclua seus verdadeiros representantes “papa-xibé”.
Maykon Serrão
Yud Amazônia.